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PONTO DIGITAL MIRADA

As palavras de Chico encenando o Brasil

Você conhece o lado dramaturgo de Chico Buarque?

Por André Venancio/Sesc-SP

leitederramado_corCena de Leite Derramado, primeiro livro de Chico Buarque a ser adaptado ao teatro

Quando o diretor Roberto Alvim manifestou seu interesse em adaptar Leite Derramado aos palcos, o caráter de monólogo do romance causou alguma desconfiança em Chico Buarque, autor do livro lançado em 2009. No entanto, superado os receios iniciais após a leitura do primeiro esboço, o compositor autorizou a adaptação que estreou nesta quinta (15/9) durante o Mirada.

Com evidente vocação política, toda a obra de Chico Buarque – na música, na literatura e na dramaturgia – sempre discute as questões sociais brasileiras. Se no livro “Leite Derramado” fica clara a relação do protagonista com a decadência social e econômica do país, são nos textos teatrais criados por ele para os palcos que surgem outros olhares para o Brasil.

Em 1967, durante a Ditadura Militar, Chico fez sua estreia na dramaturgia com Roda Viva, espetáculo dirigido por Zé Celso e protagonizado por Marília Pera. Por meio do personagem Benedito Silva, a sociedade de consumo e a manipulação midiática eram veementemente denunciadas.

Com Ruy Guerra, Chico escreveu Calabar: o elogio da traição, em 1973. Em uma grande metáfora, o texto narra a traição cometida por Domingos Calabar à coroa portuguesa e como essa ação foi interpretada de duas maneiras extremas ao longo da história. Se a princípio Calabar era visto como um traidor ganancioso, com o tempo foi tido como herói do povo brasileiro. Mais uma vez, e sempre atual, Chico denuncia a realidade distorcida dos fatos promovida pelos veículos de comunicação.

As dificuldades vividas pelos moradores das favelas, cortiços e periferias ficam explícitos em A Gota d’Água, escrita em 1975 em parceria com Paulo Pontes. O texto é uma adaptação do mito da Medeia, aqui usada como pano de fundo para expor o contraste social e econômico brasileiro.

Leite Derramado foi o primeiro livro de Chico a ir aos palcos, apesar de sua obra musical servir de inspiração para diversas montagens pelo país. Até quando ausente, o compositor se faz presente. Em Avesso do Claustro, por exemplo – que também integrou a programação desta edição do Festival – uma das canções executadas é fruto de um poema de Dom Helder Câmara escrito na intenção de ser musicado por Chico, que declinou o convite por nunca ter musicado um autor já falecido. A própria Cia do Tijolo, então, criou a melodia para as palavras de Dom Helder.

 

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