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PONTO DIGITAL MIRADA

A Bolívia contemporânea: memória, história e identidade

Por Indiara Duarte/Sesc Sorocaba

Ukhupacha Mortales - foto: Indiara Duarte

Ukhupacha Mortales

A cena teatral da Bolívia ainda é pouco conhecida no Brasil, mas o Mirada traz o Coletivo Kiknteatr para que possamos conhecer um pouco mais sobre esse cenário. Dirigida por Diego Aramburo, a“Trilogía Boliviana” é um projeto composto por 3 peças independentes: UKhupacha – Mortales, Kaipi – Morales e Hejarei Inmortales, que apesar de serem apresentadas em sequência o público pode escolher quantas e quais peças quer assistir.

Os planos subterrâneo, terreno e celestial, tríade comum às culturas do povo boliviano, são evocados em cena por meio de cabaré (utilizando o humor ácido dos índios aimarás), teatro e dança (representando mulheres da cultura Guarani, presentes no leste da Bolívia) em cada uma das obras.

O sucesso, o reconhecimento e o amor são os objetivos do personagem, que faz qualquer coisa para alcançá-los. A história delirante é contada de forma irreverente e se relaciona com a mitologia andina, em que a lógica da resistência deveria vir de mão dada com a reciprocidade, mas não vem. Relatos de traição, abusos e decepções fazem com que o ator, Winner Zeballos, passe todo o espetáculo ajoelhado como uma forma de penitência pelos atos praticados pela sua família e por si. Levando os espectadores a refletir: seria a morte o melhor ambiente para a felicidade?

A difícil missão de aceitar o outro, a pobreza social e pobreza de espírito são expressas através do teatro documental, em três histórias diferentes, de pessoas que vivem no espaço urbano, que se veem interligadas por um personagem comum às três. A dificuldade em lidar com o outro é um tema relevante: a condição de homens e mulheres e suas diferenças, assim como as diversas nacionalidades da Bolívia.

Kaipi – Morales

O poder masculino exercido sobre as mulheres é retratado em toda a trilogia em casos de estupros entre membros da mesma família, desejos reprimidos, submissão, violência psicológica e física. E fica evidente, principalmente em Hejarei – Inmortales, que o “conquistar” masculino se contrapõe ao “deixar ir”, que remete à atitude feminina de ceder como um gesto de força. É uma obra impactante, carregada de simbolismo, que utiliza a linguagem dos corpos e não das palavras.

No discurso das três obras não há uma pretensão sobre o que é a Bolívia ou quem são os bolivianos. Mas identifica-se um impulso comum ao teatro latino-americano de assumir a responsabilidade sobre as narrativas que dizem respeito à nossa memória, história e identidade.

Hejarei – Inmortales

*Leia mais sobre o Mirada 2016 aqui.