O México não tem medo da emoção. Fragmentos dos debates sobre o país homenageado

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A frase que abre este post foi dita pela atriz Ligia Cortez durante a mediação de um debate sobre o intérprete no teatro mexicano contemporâneo, e resume bem o espírito das obras teatrais trazidas para o MIRADA: assim como encara a morte de frente, o México não tem medo da emoção.

País homenageado nesta edição do Festival, o México foi tema de três encontros realizados entre os dias 06 e 12 de setembro: O México no contexto da cena latino-americana (06/09); O intérprete no teatro mexicano contemporâneo (07/09); e A violência urbana e a migração como objetos de interesse para a criação teatral mexicana (12/09).

Os assuntos mais espinhosos da sociedade mexicana contemporânea são abordados com coragem, liberdade e poesia pelos criadores cênicos da atualidade – uma forma de ir no sentido contrário à abordagem dos telejornais: migração, narcotráfico, chacinas, corrupção.

O coordenador nacional de teatro do Instituto Nacional de Bellas Artes do México, Juan Meliá(foto abaixo), destacou que entre as problemáticas da cena teatral de seu país estão as dificuldades históricas para a circulação de obras e a quase nula troca de informação entre os criadores e núcleos de criação com os países vizinhos.

Para reverter este quadro, ele citou a importância de festivais internacionais como o de Cádiz (Espanha), MIRADA (em Santos), Miami (Estados Unidos), Bogotá (Colômbia), e a necessidade de gerar novas ferramentas para estimular os realizadores a trabalharem e circularem em conjunto e desenvolver modelos e condições para que os grupos vivam de maneira profissional.

Das particularidades da cena mexicana, Meliá pontuou a forte relação com artes plásticas; o processo de descentralização inconclusa – da Capital para o interior; as diferenças entre os esquemas de produção entre a Cidade do México e as províncias (Guadalajara, Vera Cruz etc.); a produção por projeto e temporada e não por circulação; a existência de festivais gerais, isto é, que misturam mostras de teatro com mostras literárias, de dança etc.; a inexistência de salas independentes.

Apesar da dificuldade de circulação e intercâmbio, o teatro mexicano se mostrou vigoroso aos olhos da jornalista cubana Vivian Mártinez Tabares (foto abaixo), editora da Revista Conjunto, do Departamento de Teatro da Casa de las Américas, em Cuba. Durante o tempo em que viveu na Cidade do México, na primeira metade dos anos 2000, ela conta ter visto uma cena vigorosa, conectada com a vida e com situação política do país. “É um país multicultural, com uma dificuldade de circulação histórica e com criações que partem de uma carência material sublimada pela imaginação, assim como Cuba.”

A jornalista cita alguns nomes que imprimem força à nova cena teatral do México, como Regina Orozco, Liliana Felipe, Guillermo Gómez Peña, Grupo Árbol de Teatro.

A dramaturgia

O professor emérito da Catholic University of America (Estados Unidos) Mario Rojas observou que, entre os temas mais abordados pelos criadores contemporâneos estão as relações familiares e as relações com a morte – que são muito diferentes de outras culturas.

Na fala de Juan Meliá, foi destacado o crescimento de uma geração potente de novos dramaturgos, que dirigem suas obras ou trabalham em parceria com outros diretores e autores de países próximos.

O intérprete

Uma tendência no teatro mexicano é a de que o ator está passando da figura de intérprete para a de criador cênico. Karina Gide (foto abaixo) – atriz mexicana dos espetáculos “Incêndios”, do grupo Tapioca Inn, e “O pequeno quarto ao final da escada”, do Teatro Del Farfullero, ambos apresentados no MIRADA -, disse que o ator tem de ser uma rocha, mas ser capaz de correr riscos, manter a capacidade para trocar de personalidade. “Hay que permitir que las palavras atravessen lo cuerpo. Hay que mirar lo que lo personaje mira.”

Em uma fala bastante inspirada sobre o ofício de ator, Maurício Garcia Lozano – diretor de “O pequeno quarto ao final da escada” - declarou admiração e amor incondicionais pelo ator, que é  peça fundamental do teatro e não importa em que país. “Quero crer que o ator é um criador, mas o produto artístico do ator é dificilmente constatável. O ator é, ao mesmo tempo, pintor e quadro. O ator constrói ficção, realidade, mundos paralelos.”

Para Lozano, o ator tem de possuir três corpos básicos – corpo físico, corpo emocional e corpo imaginário, todos conectados – e ser capaz de construir o universo imaginário de forma indiscutível. “O ator deve ser capaz de construir a fragilíssima concretinação de que o que conta é a verdade, mas na verdade, é mentira. O ator tem que habitar esse universo que está fora dele com absoluta sinceridade. E isso vai além da técnica (…) O ator pode perder tudo, somente não pode perder o pulso. O ator é a antena ideal do mundo imaginário.”

 A violência

Antonio Barragán (do grupo Por Piedad Teatro Producciones), refletiu que os artistas são membros despertos da sociedade porque falam dos problemas, e falam do concreto e do abstrato usando a poesia, o anedótico, o alegórico, para não soar sensacionalista.

Como exemplo, ele citou “Amarillo” (foto acima) – apresentado nos dias 11 e 12 de setembro, no Teatro Municipal Brás Cubas, em Santos, e “O Dragão Dourado” (abaixo) – dias 12 e 13 de setembro, na Casa da Frontaria Azulejada -, que aborda a imigração chinesa para falar dos problemas sociais do México.

“Como abordar a realidade da migração, da violência, sem nos comprometermos?”, lançou Jorge Varas, diretor de “Amarillo” (Teatro Línea de Sombra), para quem a violência é muito mais espetacular do que qualquer ficção. “A morte é de uma teatralização que nenhuma ficção pode competir (…) Nossas ferramentas são suficientes para mostrar isso?”.

Assista, abaixo, a um trecho do espetáculo “Os Assassinos” (do grupo El Milagro Teatro e Carretera 45 Teatro), apresentado dias 11 e 12 de setembro, no Teatro SESC Santos:

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5 – 15 de setembro de 2012

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