Conflitos bélicos e íntimos unem produções do Paraguai, Costa Rica e Cuba

A edição 2012 do MIRADA surpreende pela abrangência de países, assumindo a vocação do Festival em promover a troca de saberes e olhares sobre a realidade cultural dos povos ibero-americanos, rompendo fronteiras e pré-conceitos.
Em 2010, foram Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Espanha, México, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela os países a representar a atual produção teatral.
Em 2012, são Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Espanha, México, Paraguai, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela.
Você deve ter notado que o MIRADA desde ano abrange três países que não estavam na primeira edição e que raramente figuram nos festivais latino-americanos do Brasil: Paraguai, Costa Rica e Cuba. Dos países da primeira edição, apenas Equador não consta nesta seleção.
Vale lembrar aqui a fala de uma das curadoras do Festival, em 2010, ao blog do MIRADA, sobre a vinda do Paraguai: “Ainda temos a obrigação de convidar o Paraguai, exatamente por causa da guerra (1864-1870, da Tríplice Aliança – Brasil, Argentina e Urugai contra o Paraguai). (…) Os homens de lá ainda são vistos como relíquias e mulheres têm de se desapegar disso. Acho que a nossa prioridade tem de ser o Paraguai na próxima edição. Se não houver um espetáculo bom, podemos trazer diretores e dramaturgos.”, disse Isabel Ortega.
Felizmente, os curadores encontraram uma produção pungente no Paraguai, e trazem, de Assunção, o espetáculo “Cenizas” (Cinzas, 2009), do grupo Hara Teatro. Interessante observar como o teatro paraguaio continua reverberando os efeitos da Guerra da Tríplice Aliança – conhecida, no Paraguai, como Guerra Grande; e, no Brasil, como Guerra do Paraguai. Será oportunidade rara de os espectadores brasileiros conhecerem e refletirem sobre os horrores da guerra à sociedade paraguaia por meio de uma montagem contemporânea, que parte do teatro-dança e da música experimental ao vivo para abordar justamente as dificuldades das mulheres paraguaias de subsistirem após a perda de seus pais, maridos e filhos.
Costa Rica
Do país da América Central vem “Madre Coraje y sus hijos” (Mãe Coragem e Seus Fihos, da Compañia Nacional de Teatro), de Bertolt Brecht. Com direção de Eugenia Chaverri, a montagem marcou as comemorações em torno dos 40 anos da companhia costarriquenha em 2011, e dialoga com “Cenizas” – da cia paraguaia Hara Teatro, citada acima -, uma vez que também aborda a luta de uma mulher pela sobrevivência e para manter a sua prole durante a guerra. No clássico de Brecht, a trama se passa no século 17, durante os combates militares entre Polônia e Alemanha. A linguagem também segue os padrões do teatro contemporâneo, com música ao vivo e projeções de imagens.
Cuba
No ano em que se comemora o centenário de nascimento de um dos principais nomes da literatura e do teatro cubanos, Virgílio Piñera (1912-1979), o MIRADA apresenta ao Brasil “Aire frío” (Ar Frio, da Argos Teatro). A direção é de Carlos Celdrán, cofundador do grupo Argos Teatro há 15 anos. Um clássico da dramaturgia cubana que retrata o cotidiano de uma família que ainda diz muito sobre o país de hoje.
E, também neste espetáculo, a protagonista é uma mulher, forte. “Aire Frío”: a personagem Luz Marina costura roupas para fora e garante o sustento da família. Mas, diferentemente das montagens paraguaia e costarriquenha, nesta, os conflitos não são bélicos, mas internos, pois acompanham um período de 18 anos (de 1940 a 1958) da família Romanguera, de Havana: as relações entre os irmãos, a vida conjugal dos pais, a falta de dinheiro às vésperas da revolução socialista de 1959.