coliseu – Sesc Mirada https://mirada.sescsp.org.br/2016 MIRADA - Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas de Santos Tue, 31 Jan 2017 21:44:28 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.5.8 [Crítica] Conexões nebulosas https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/conexoes-nebulosas/ https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/conexoes-nebulosas/#respond Fri, 16 Sep 2016 20:32:23 +0000 https://mirada.sescsp.org.br/2016/?p=2440 por Daniel Schenker

antigonon-critica

Antígona é pouco mais que uma inspiração para a encenação cubana Antigonón, um Contingente Épico, dirigida por Carlos Díaz, com dramaturgia de Rogelio Orizondo. Há menções à tragédia de Sófocles – não só à trama centrada na mulher que, desobedecendo a ordem do rei Creonte, se mostra determinada a enterrar o irmão, Polinice, considerado traidor de guerra, como à Trilogia Tebana, também formada por Édipo Rei e Édipo em Colono, a exemplo da menção ao momento em que Antígona guia o pai, Édipo, já cego, após furar os próprios olhos. Mas, ao se voltarem para a história e a realidade de Cuba (ou, numa perspectiva mais abrangente, da pátria), Orizondo e Díaz adquirem voo independente em relação ao texto original.

Díaz evita reiterações. Os elementos que integram esse espetáculo da companhia El Público (a movimentação dos atores, as projeções, os figurinos) não se confirmam mutuamente. Ao invés de fornecer chaves seguras de transmissão de conteúdos, mensagens, o diretor procura estimular a autonomia de cada espectador na construção da própria interpretação sobre a cena. A decisão de não facilitar a apreciação pode ser vista como um mérito, como uma bem-vinda postura de resistência (termo que norteia as ações de Antígona). Mas, por outro lado, Antigonón, um Contingente Épico desponta como um trabalho um tanto cifrado, pouco acessível até mesmo ao espectador munido de referências. É difícil estabelecer conexão com a montagem, apesar da instigante construção da cena.

Uma apreciável secura atravessa o espetáculo. Essa característica fica evidenciada desde o início, quando os atores, nus, realizam uma partitura de movimentos (concebida por Xenia Cruz e Sandra Ramy), sem acompanhamento de texto ou de música. Carregam uns aos outros até formarem o que parece ser uma montanha de cadáveres, da qual alguém se desvencilha. A cenografia (de Robertiko Ramos) é bastante simples, composta por biombos cobertos por jornais amassados, com símbolos estampados. Há relativamente pouca trilha sonora (de Bárbara Llánes) ao longo do espetáculo, o que sinaliza corajosa aridez, mesmo quando uma atmosfera carnavalizada começa a despontar por meio dos figurinos (de Celia Ledón e Robertiko Ramos). São peças extravagantes, que, muitas vezes, não ocultam a nudez, usadas de forma sugestivamente invertida, o que acentua a ambiguidade sexual destacada ao longo da apresentação.

O corpo tem importância central dentro da dramaturgia. Orizondo aborda um corpo-pátria, esvaziado, devorado. Como resistir ao ter o corpo invadido? A resposta parece estar na presença das atrizes, que assumem a palavra durante boa parte do tempo por meio de um registro vocal firme, contundente, combativo, como Antígonas que reviram as tripas do irmão e não hesitam em fazer o que consideram fundamental, inadiável, independentemente da lei imposta pela autoridade. O palco é tomado por figuras endurecidas, desiludidas. Na contemporaneidade, como no passado remoto, não há espaço para o romantismo ou para a ilusão. Essas associações eventuais, porém, não  chegam a ganhar corpo nesse espetáculo instigante, mas excessivamente nebuloso.


*Daniel Schenker é Bacharel em Comunicação Social pela Faculdade da Cidade. É doutor em artes cênicas pelo Programa de Pós Graduação em Artes Cênicas da UniRio. Trabalha como colaborador dos jornais O Globo e O Estado de S.Paulo e da revista Preview. Escreve para os sites Teatrojornal (teatrojornal.com.br) e Críticos (criticos.com.br) e para o blog danielschenker.wordpress.com. É membro do júri dos prêmios da Associação de Produtores de Teatro do Rio de Janeiro (APTR), Cesgranrio, Questão de Crítica e Reverência.

*Leia mais sobre o Mirada 2016 aqui.

]]>
https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/conexoes-nebulosas/feed/ 0
[Crítica] ANTI-TRATADO DE tordesilhas https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/anti-tratado-de-tordesilhas/ https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/anti-tratado-de-tordesilhas/#respond Thu, 15 Sep 2016 20:45:55 +0000 https://mirada.sescsp.org.br/2016/?p=2270 Por Welington Andrade

acomedialatinoamericana_fotospatriciacividanes_santos1_01

“Se esse tempo latino-americano nos parece premente, escandaloso, contraditório, como em época de revolução permanente, assim também se nos apresentará o panorama da criação artística; algumas condições vêm de outrora, mas recebem um matiz próprio da época; outras são geradas nos problemas culturais do momento; e há ainda as que apontam para o futuro imediato”. Ángel Rama, Dez problemas para o romancista latino-americano.

Apresentada neste Mirada 2016 como um trabalho ainda em processo, A comédia latino-americana, segunda parte do díptico A tragédia latino-americana (cuja estreia se deu na MIT 2015) e A comédia latino-americana – com direção de Felipe Hirsch e atuação do coletivo Ultralíricos (formado, aqui, por Caco Ciocler, Caio Blat, Camila Márdila, Georgette Fadel, Javier Drolas, Julia Lemmertz, Magali Biff e Rodrigo Bolzan) – reúne uma série de textos da literatura em língua portuguesa e em língua espanhola do continente americano que tematizam “a violência, o binarismo político e ideológico, o sistema elitista, a não valorização da própria cultura, a falta de consciência histórica, entre outros assuntos tomado como característicos da América Latina”, segundo consta no catálogo completo do festival.

A criação mostrada ao público no Teatro Coliseu de Santos na última terça-feira, dia 13 de setembro, constitui uma espécie de “girafa de três pernas”, expressão que o dramaturgo irlandês Samuel Beckett (cuja figura está estranha e entranhadamente implícita na segunda parte do espetáculo) utilizou para tratar do processo de construção de Fim de partida, quando a peça ainda se dividia em dois atos, posteriormente sintetizados em um. O desequilíbrio estrutural da versão de A comédia latino-americana apresentada no dia 13 (no dia anterior, segundo quem esteve presente à sessão, outra foi a conformação dramatúrgica concretizada em cena) configurou-se certamente como um dos elementos que mais chamaram a atenção.

A primeira parte da apresentação evocou certo espírito do teatro de revista, ao mostrar – como se fizessem parte de um todo ecleticamente constituído – seis quadros de naturezas diversas, que dialogam em maior ou menor medida com a trilha sonora original composta por Arthur de Faria, executada ao vivo pelo próprio músico à frente da Ultralíricos Arkestra, cujos integrantes estão reunidos à esquerda do palco. No primeiro deles, que tem início no plano da plateia, Rodrigo Bolzan e Magali Biff encarnam um casal em litígio pelo fato de ele gostar de teatro, e ela somente de telenovelas. A rigor, tal mote se desdobra em uma discussão a respeito da natureza da representação teatral e de sua recepção por parte do espectador – que a dupla de intérpretes, esbanjando talento, aliás, entabula tangida pela máscara do patético. Segue-se um número musical em que todos os atores, dispostos em formação coral e tendo sob suas cabeças chapéus bastante engraçados, cantam uma canção que trata do neoliberalismo. A cada um deles compete o protagonismo de estrofes especialmente entoadas. O quadro é longo (a extensiva duração de todos eles, aliás, constitui, tudo leva a crer, um elemento intencional na gramática do trabalho) e alia a seriedade subjacente ao tema à hilaridade controlada com a qual ele é tratado.  Posteriormente, uma alentada declaração em off chega aos ouvidos do espectador sob a forma de um manifesto. O que ocorre depois é o desmonte da descomunal parede de tijolos de isopor erguida como fundo de cena até a primeira metade do palco (a direção de arte do projeto é de Daniela Thomas e Felipe Tassara), realizado em conjunto por todos os atores com a ajuda de integrantes da equipe técnica. Sobre os escombros tem início o próximo quadro, no qual Caco Ciocler, transitando entre os registros cômico-popular e grotesco, encarna um Pero Vaz de Caminha pós-moderno, cujo discurso alia violência, desfaçatez e escatologia. Encerra essa primeira parte uma canção apresentada por Georgette Fadel.

Eis que, após o intervalo, o espírito de revista da primeira parte se dilui e A comédia latino-americana faz da narrativa La libertad total, do escritor argentino Pablo Katchadjian, seu mote. Tendo seus textos em mãos para serem lidos, mas exibindo excelente domínio no exercício de inflexões e intenções, Julia Lemmertz e Georgette Fadel dão início a um jogo de desabrida retórica e imaginação humorísticas, marcas do trabalho desse escritor ainda desconhecido entre nós, cuja filiação literária remonta ao Beckett de Esperando Godot e Fim de partida. Todos os demais atores pouco a pouco entram em cena, demonstrando a mesma prontidão para os jogos dialéticos de Katchadjian.

A materialização dessa loquacidade lúdica sob a forma de espetáculo teatral é bastante desafiadora e aponta para o tom de provocação geral que preside a essa comédia latino-americana capitaneada por Felipe Hirsch. Ainda que anunciando querer somente dar “um recorte” da literatura do continente, o espetáculo pode – conscientemente ou não – vir a apostar no conceito de comarca desenvolvido por Ángel Rama, por meio do qual o crítico uruguaio considerou possível identificar a “homogeneidade de elementos naturais, étnicos e culturais que convergem em formas similares de criação artística”. As questões decorrentes da inserção desses escritores em suas comarcas e de sua participação em um espetáculo teatral tecido pelos fios da transculturação podem fazer do projeto um ótimo espécime por meio do qual se discuta o complexo problema da liberdade de criação no teatro ou simplesmente se desfrute dele.

*Welington Andrade é doutor em literatura brasileira pela USP, na área de dramaturgia. É professor do curso de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero desde 1997, crítico de teatro da revista Cult e autor de um dos capítulos da História do teatro brasileiro: do modernismo às tendências contemporâneas (Editora Perspectiva/Edições Sesc-SP, 2013).

*Leia mais sobre o Mirada 2016 aqui.

]]>
https://mirada.sescsp.org.br/2016/critica/anti-tratado-de-tordesilhas/feed/ 0
Mirada pela cidade – espaços importantes da cidade que abrigam peças https://mirada.sescsp.org.br/2016/digital/mirada-pela-cidade-espacos-importantes-da-cidade-que-abrigam-pecas/ https://mirada.sescsp.org.br/2016/digital/mirada-pela-cidade-espacos-importantes-da-cidade-que-abrigam-pecas/#respond Sat, 10 Sep 2016 00:33:38 +0000 https://mirada.sescsp.org.br/2016/?p=1497 por Patrícia Diguê

Shakespeare em um teatro de 1882; uma estreia nacional em uma sala com decoração italiana montada com 39 lustres; um espetáculo internacional em um antigo armazém que ainda mantém sua fachada original de azulejos portugueses; e uma peça que fala da resistência das mulheres durante a ditadura em uma fortaleza de verdade. Estes são apenas alguns detalhes dos espaços ocupados pelas obras do Mirada. Além dos teatros e salas de espetáculos da cidade, o festival está sendo realizado também em construções históricas, pontos turísticos e até nas ruas.

Primeiro edifício construído para fins teatrais em Santos, o Teatro Guarany foi inaugurado em 1882 e destruído por um incêndio que poupou apenas as paredes externas, em 1981. Após duas décadas de abandono, foi reconstruído e reinaugurado em 2008. Por lá, passarão “Hamlet – Processo de Revelação” (BRA), “Brickman Brando Bubble Boom” (ESP), “Birdie” (ESP) e “No daré hijos, daré versos” (URU).

guarany

A história do Coliseu começou em 1897, com a inauguração de um ginásio de madeira, com velódromo, arquibancada e botequim. Em 1909, foi substituído por um teatro com 1.500 lugares e acústica considerada perfeita. Em 1924, foi reinaugurado com a configuração atual e 2.300 lugares. Terão o privilégio de apreciar a arte italiana que decora o local quem for assistir a “Zululuzu” (POR), “Comédia latino-americana” (BRA) e “Antigonon, um contingente” (CUB).

coliseu

Na Casa da Frontaria Azulejada, estão programados “Quando todos pensavam que havíamos desaparecido” (MEX), “Cabras” (BRA) e “Rebú” (COL). O armazém é um dos prédios históricos mais significativos de Santos, construído em 1865 para ser residência e armazém de um bem sucedido comerciante de café.

frontaria azulejada

A Fortaleza da Barra (hoje Museu Histórico Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande), construída em 1584 e reconhecida como Patrimônio Histórico Nacional pelo IPHAN em 1964, ocupa um esporão rochoso no canal do porto. O local foi o escolhido pela Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz para apresentar “Viúvas – Performance sobre a ausência” (BRA), que fala sobre a resistência das mulheres que perderam pais, maridos e filhos para as ditaduras latino-americanas. A montagem foi criada em um lugar histórico de Porto Alegre, as ruínas do presídio de segurança máxima da Ilha das Pedras Brancas, ambiente que será reproduzido na fortaleza.

fortaleza da barra menor

Além desses, estão na lista de espaços que recebem espetáculos o C.A.I.S. Vila Mathias, o Teatro Brás Cubas, a Cadeia Velha, a Casa Rosada (Prédio de Prevenção da Sabesp), a Sala Princesa Isabel, a Bacia do Mercado, a Estação do Valongo, a Fonte do Sapo e o Emissário Submarino.

*Leia mais artigos sobre o Mirada 2016 aqui

]]>
https://mirada.sescsp.org.br/2016/digital/mirada-pela-cidade-espacos-importantes-da-cidade-que-abrigam-pecas/feed/ 0